Muito importante assistir a essa entrevista para conseguir enxergar uma saída no fim do túnel da atual crise e refletir sobre outras formas de democracia.
https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=218042368802211&id=163618174244631
Bares, cafés e clubes, a partir do século XIX, não eram apenas um ambiente para a happy hour. Eles foram o cenário onde questões políticas, filosóficas, movimentos artísticos revolucionários se espalharam. O propósito deste site é o mesmo: criar um espaço virtual para expressão livre de ideais, reflexões e sentimentos, com espírito crítico em relação a nossa Cultura.
Muito importante assistir a essa entrevista para conseguir enxergar uma saída no fim do túnel da atual crise e refletir sobre outras formas de democracia.
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Fridmann, o economista que defendeu o capitalismo neoliberal, e suas ideias são considerados os responsáveis pelas crises econômicas dos últimos 40 anos. Inclusive pelo crash de 2008, pela qual nenhum responsável foi preso. Apesar de defender a não intervenção do estado na economia, as empresas de seguro aceitaram dinheiro do governo para cobrir seu rombo e ainda ganharam bonificação. O lucro é privado, mas o investimento é público, porque o povo americano com seus impostos salvou essas empresas particulares.
As teorias econômicas de Fridmann, que eram consideradas loucuras após a crise de 1929, ganharam força na década de 1950, contudo recentemente foram descartadas por dois vencedores do prêmio Nobel, devido aos desastres econômicos que têm causado, mas os políticos ainda não estudaram o resultado catastrófico dessas teorias e continuam aplicando como se ainda estivéssemos na década de 1910. O laissez-faire fracassou várias vezes, o controle total do Estado também. No entanto, nenhum político fala em adotar um meio termo ou uma terceira via para solução das crises econômicas. Grécia, Portugal, Espanha, EUA são alguns dos países que quebraram recentemente, após a globalização que não trouxe o progresso prometido para a classe trabalhadora pelo menos.
Com esse documentário, chega-se à conclusão de que paz e capitalismo neoliberal são incompatíveis. O capitalismo precisa da guerra, precisa da crise, o que é trágico. Segue um resumo do livro “A Doutrina do Choque” (2009): documentário dirigido por M. Whitercross e M. Winterbottom, roteiro de Naomi Klein.Naomi Klein põe um fim ao mito de que o mercado livre global triunfou democraticamente. Expondo o modo de pensar, o rasto do dinheiro e os fios de marioneta por detrás das crises e guerras mundiais das últimas quatro décadas. “A Doutrina do Choque” é a história absorvente de como as políticas de “mercado livre” da América têm vindo a dominar o mundo – através da exploração de povos e países em choque devido a inúmeros desastres. Na conjuntura mais caótica da guerra civil do Iraque, é apresentada uma nova lei que permitiria à Shell e à BP reclamar para si as vastas reservas petrolíferas do país…
Imediatamente a seguir ao 11 de Setembro, a administração Bush concessiona, sem alarido, a gestão da “Guerra contra o Terror” à Halliburton e à Blackwater… Depois de um tsunami varrer as costas do sudeste asiático, as praias intocadas são leiloadas ao desbarato a resorts turísticos… Os residentes de Nova Orleães, espalhados pelo furacão Katrina, descobrem que as suas habitações sociais, os seus hospitais e as suas escolas jamais serão reabertas.
Estes acontecimentos são exemplos da “doutrina de choque”: o aproveitamento da desorientação pública no seguimento de enormes choques colectivos – guerras, ataques terroristas ou desastres naturais – para ganhar controlo impondo uma terapia de choque económica. Por vezes, quando os dois primeiros choques não são bem sucedidos em eliminar a resistência, é empregue um terceiro choque: o eléctrodo na cela da prisão ou a arma Taser nas ruas. Baseado em investigações históricas inovadoras e em quatro anos de relatos no terreno em zonas de desastre, “A Doutrina do Choque” mostra de forma vívida que o capitalismo de desastre – a rápida reorganização corporativa de sociedades que tentam recuperar do choque – não começou com o 11 de Setembro de 2001. O livro traça um percurso das suas origens que nos leva há cinquenta anos atrás, à Universidade de Chicago sob o domínio de Milton Friedman, que produziu muitos dos principais pensadores neoconservadores e neoliberais cuja influência, nos nossos dias, ainda é profunda em Washington. São estabelecidas novas e surpreendentes ligações entre a política económica, a guerra de “choque e pavor” e as experiências secretas financiadas pela CIA em electrochoques e privação sensorial na década de 1950, pesquisa essa que ajudou a escrever os manuais de tortura usados hoje na Baía de Guantanamo.
Jorge Fernandes
Com esse documentário, chega-se a conclusão de que paz e capitalismo neoliberal são incompatíveis. O capitalismo precisa da guerra, o que é trágico.
materialismo histórico-geográfico
Deixo abaixo duas notas que fiz em minha página do facebook sobre a Palestina.
Sobre a “questão palestina”
Apenas acordo e, viciadíssimo nas redes sociais, abro a página do facebook onde encontro um post da “Eurasia – Rivista di Studi Geopolitici”, divulgando um número especial sobre a Palestina (edição n. 2, 2009). Nada mal, sabendo usar, até que as redes sociais podem contribuir para o nosso esclarecimento acerca deste “mundo grande e terrível”.
Único texto livre de pagamento, o editorial (Palestina, Provincia d’Eurasia) é bastante completo, até mesmo em termos de reconstituição histórica, e logo me põe a conhecer dados demográficos realmente aterradores. Vamos a eles.
Em 1880 a comunidade judaica na Palestina — que por esta época era uma estável província do Império Otomano, gozando mesmo de um importante desenvolvimento econômico, social e cultural — era de apenas cerca de 24 mil indivíduos; de 1880 a 1908 passa…
Ver o post original 669 mais palavras
À Palestina, o sangue, que jorra das veias de seu povo, É esquecido, é ignorado. Até quando fingiremos que tudo é normal? Até quando viraremos as costas àqueles que sofrem de um grande mal? “Assim caminha a humanidade”, uns dizem. Outros permanecem calados, Enquanto seus filhos se esquivam da morte, sem Saber se seus passos serão lembrados. Todos eles serão só números quantificados? Alguns ainda virarão teses de doutorado, Mas sem nome, sem lar, nem água nem chão, Todos seus filhos serão prisioneiros em seu próprio torrão? E todos nós sem sentir vergonha por deixar que isso aconteça a um irmão? Godoy 11-07-2012
É difícil imaginar o autor argentino como um rebelde, já que o senso comum acredita que ele era apenas um homem em sua biblioteca, um dândi alheio à política, em sua torre de marfim. Ele próprio dizia-se avesso à política e autodefiniu-se como um anarquista conservador.
Contudo, sua vida e suas escolhas polêmicas dizem o oposto. Borges foi diretor da Biblioteca Nacional entre 1955 e 1972. Por ser anti-peronista radical, o escritor foi demitido de seu cargo quando Perón assumiu seu terceiro mandato. Assim, os mais de 1000 livros doados de sua biblioteca pessoal para a Biblioteca Nacional foram “esquecidos” pelos funcionários peronistas e ficaram encaixotados por mais de 30 anos. Recentemente, uma busca tem revelado que outros livros foram doados por ele, mas omitiram a identidade do doador. O autor “alienado” foi perseguido por suas posições políticas.
Borges tinha horror ao nazismo e às consequências da Segunda Grande Guerra. O guarda-costas de Evita Perón, Otto Skorzeny havia sido o preferido de Hitler e de Mussolini. Otto auxiliou a fuga de vários nazistas para a Argentina com auxílio de Perón. Borges foi um forte opositor aos nazistas radicados na argentina que representavam, para ele, um perigo gravíssimo à comunidade judaica local. Por isso, Borges posicionou-se desastradamente a favor da ditadura na Argentina, acreditando que na época era a única alternativa ao peronismo. Além disso, as perseguições, que sofreu por manifestar suas posições políticas em voz alta, causou uma ruptura irreconciliável com o governante populista.
Um almoço com o ditador Videla é o momento mais assustador de sua biografia, mas teria ele aprendido que a rebeldia não lhe valeria nada, apenas o desemprego? Condescendeu para não ter que fugir como outros escritores e poder escrever sem o bafo da censura em seu cangote? Foi ingênuo acreditando que dos males aquela Ditadura seria o menor? Ou foi arrivista? Enfim, só podemos constatar que a sociedade argentina não conseguiu pegar uma terceira via, criar opções políticas democráticas também por questões externas: o braço dos EUA e seu projeto para a América Latina.
No fim de sua vida, perguntaram-lhe que mensagem deixaria aos jovens, ele respondeu o seguinte: “Eu não soube administrar minha vida, então não posso dirigir a vida dos outros. Minha vida foi uma série de equívocos. Não posso dar conselhos. Ando um pouco à deriva. Quando penso no meu passado, sinto vergonha. Eu não transmito mensagens, os políticos transmitem mensagens.”
Sentiremos vergonha?
Contudo, a mensagem que podemos aprender desse terrível equívoco borgeano é o seguinte: no Brasil o ódio a certo partido político, tido como “populista”, pode nos levar ao pior dos pesadelos, já que temos assistido ao crescimento de um candidato com posicionamentos radicais, muito similares aos dos nazistas. Em seus comícios, tal candidato afirma que tornará o Brasil um país unicamente cristão e expulsará as minorias; Hitler também tentou eliminar todos os judeus ou qualquer um que fosse diferente do alemão típico, se é que isso existe. Este é Jair Bolsonaro que confessou ter recebido 200 milhões de reais em propina da JBS (dona da Friboi), além de ter planejado atentado contra o seu próprio quartel para falsamente acusar comunistas, na época em que era militar. Por isso foi “expulso” da corporação.
Teremos, então, uma teocracia, onde não existirá mais o direito de professar sua fé livremente. Tal direito só pode ser defendido por um Estado laico que deveria proteger todas as religiões igualmente, inclusive o direito de não professar fé alguma. Nossa democracia, já rudimentar, está seriamente ameaçada, visto que a bancada evangélica ganha cada vez mais força, apelando para um pânico moralista ao invés de se ater às questões de interesse público que visem o bem comum. Corremos inocentemente para o abismo fazendo piadas, subestimando um homem perigoso, sem perceber que não há apanhadores no campo de centeio.
Godoy
Il y a six mois, hier encore, on se demandait: «Que va-t-il faire?» Provisoirement, déchiré par des contradictions qu’il faut respecter, il avait choisi le silence. Mais il était de ces hommes rares, qu’on peut bien attendre parce qu’ils choisissent lentement et restent fidèles à leur choix. Un jour, il parlerait. Nous n’aurions pas même osé risquer une conjecture sur ce qu’il dirait. Mais nous pensions qu’il changeait avec le monde comme chacun de nous: cela suffisait pour que sa présence demeurât vivante.
Nous étions brouillés, lui et moi: une brouille, ce n’est rien – dût-on ne jamais se revoir -, tout juste une autre manière de vivre ensemble et sans se perdre de vue dans le petit monde étroit qui nous est donné. Cela ne m’empêchait pas de penser à lui, sentir son regard sur la page du livre, sur le journal qu’il lisait et de me dire: «Qu’en dit-il? Qu’en dit-il EN CE MOMENT?»
Son silence que, selon les événements et mon humeur, je jugeais parfois trop prudent et parfois douloureux, c’était une qualité de chaque journée, comme la chaleur ou la lumière, mais humaine. On vivait avec ou contre sa pensée, telle que nous la révélaient ses livres – «la Chute», surtout, le plus beau peut-être et le moins compris – mais toujours à travers elle. C’était une aventure singulière de notre culture, un mouvement dont on essayait de deviner les phases et le terme final.
Il représentait en ce siècle, et contre l’Histoire, l’héritier actuel de cette longue lignée de moralistes dont les oeuvres constituent peut-être ce qu’il y a de plus original dans les lettres françaises. Son humanisme têtu, étroit et pur, austère et sensuel, livrait un combat douloureux contre les événements massifs et difformes de ce temps. Mais, inversement, par l’opiniâtreté de ses refus, il réaffirmait, au coeur de notre époque, contre les machiavéliens, contre le veau d’or du réalisme, l’existence du fait moral.
Il était pour ainsi dire cette inébranlable affirmation. Pour peu qu’on lût ou qu’on réfléchît, on se heurtait aux valeurs humaines qu’il gardait dans son poing serré: il mettait l’acte politique en question. Il fallait le tourner ou le combattre: indispensable en un mot, à cette tension qui fait la vie de l’esprit. Son silence même, ces dernières années, avait un aspect positif: ce cartésien de l’absurde refusait de quitter le sûr terrain de la moralité et de s’engager dans les chemins incertains de la pratique. Nous le devinions et nous devinions aussi les conflits qu’il taisait: car la morale, à la prendre seule, exige à la fois la révolte et la condamne.
Nous attendions, il fallait attendre, il fallait savoir: quoi qu’il eût pu faire ou décider par la suite, Camus n’eût jamais cessé d’être une des forces principales de notre champ culturel, ni de représenter à sa manière l’histoire de la France et de ce siècle. Mais nous eussions su peut-être et compris son itinéraire. Il avait tout fait – toute une oeuvre – et, comme toujours, tout restait à faire. Il le disait: «Mon oeuvre est devant moi.» C’est fini. Le scandale particulier de cette mort, c’est l’abolition de l’ordre des hommes par l’inhumain.[…] Rarement, les caractères d’une oeuvre et les conditions du moment historique ont exigé si clairement qu’un écrivain vive.
L’accident qui a tué Camus, je l’appelle scandale parce qu’il fait paraître au coeur du monde humain l’absurdité de nos exigences les plus profondes. Camus, à 20 ans, brusquement frappé d’un mal qui bouleversait sa vie, a découvert l’absurde, imbécile négation de l’homme. Il s’y est fait, il a pensé son insupportable condition, il s’est tiré d’affaire. Et l’on croirait pourtant que ses premières oeuvres seules disent la vérité de sa vie, puisque ce malade guéri est écrasé par une mort imprévisible et venue d’ailleurs. L’absurde, ce serait cette question que nul ne lui pose plus, qu’il ne pose plus à personne, ce silence qui n’est même plus un silence, qui n’est absolument plus rien.
Je ne le crois pas. Dès qu’il se manifeste, l’humain devient partie de l’humain. Toute vie arrêtée même celle d’un homme si jeune -, c’est à la fois un disque qu’on casse et une vie complète. Pour tous ceux qui l’ont aimé, il y a dans cette mort une absurdité insupportable. Mais il faudra apprendre à voir cette oeuvre mutilée comme une oeuvre totale.
Dans la mesure même où l’humanisme de Camus contient une attitude humaine envers la mort qui devait le surprendre, dans la mesure où sa recherche orgueilleuse et pure du bonheur impliquait et réclamait la nécessité inhumaine de mourir, nous reconnaîtrons dans cette oeuvre et dans la vie qui n’en est pas séparable la tentative pure et victorieuse d’un homme pour reconquérir chaque instant de son existence sur sa mort future.
Jean-Paul Sartre
(Texte publié le 7 janvier 1960 dans « France Observateur ».)
“Protesto pacífico” não é possível sem investimentos em Educação
O que me espanta é que a violência não seja muito maior
Thaís de Godoy
Todos os dias, aproximadamente 14 milhões de desempregados, outros tantos assalariados e subempregados assistem às notícias sobre a roubalheira de empresários e políticos, que passa a casa dos bilhões. A população injustiçada, que não tem Educação de qualidade, nem saúde, nem segurança, e paga seus impostos diretamente nos produtos que compra, se sente cada dia mais tripudiada pelos poderosos.
Um Estado violento, um jornalismo violento, que repete continuamente que bandido bom é bandido morto, estimula o instinto de violência dos espectadores. Nesse momento, porém, os maiores bandidos são os políticos e empresários pois com apenas uma assinatura podem matar aos milhares pessoas do país inteiro.
Ontem, a imprensa apesar dos fatores acima rotulou os manifestantes dos protestos contra o governo de vândalos, sem a menor análise do contexto em que vivemos, numa abordagem simplista da situação causada em partes pela própria mídia. É preciso analisar o que vem ocorrendo nesses protestos que não atendem aos interesses do governo.
Nesse protesto se infiltraram elementos da polícia mascarados a paisana para começar a agressão e ter um pretexto para a polícia fardada atacar os verdadeiros manifestantes. Foi flagrado por filmagens amadoras um grupo infiltrado que combinava um ataque, agindo totalmente contra as orientações dos carros de som de quem organizava o evento. Essa tática é muito conhecida de manifestantes opositores de governos autoritários.
Num relato de policiais civis, que mostraram seus rostos, deram seus nomes e patentes, Major Hélio Cunha, Tenente Fonseca e o Diretor do Sinpol, a versão é de que o ataque gratuito partiu da PM de forma covarde contra os cidadãos sem que eles tivessem sequer como reagir às bombas.
Um fato “estranho” é por que os manisfestantes queimariam os próprios banheiros que foram colocados ali para servi-los por sindicatos e outras organizações? Outro é como os funcionários públicos sabiam com antecedência que esses grupos se dirigiriam até os prédios dos Ministérios e decidiram evacuar os edifícios com antecedência e a polícia não? Se a polícia sabia dessa ação por que não os impediu de se dirigirem para lá?
Então, jornalistas, como se tivessem nascido ontem, ficam espantados quando a população se revolta e parte para a violência. O que me espanta é que a violência não seja muito maior e que a população inteira não esteja protestando.
Para a população, vandalismo é desviar o dinheiro da previdência que ela pagou por 30 anos, enquanto um político trabalha só 8, é roubar de hospitais, de escolas, da merenda das crianças. O vandalismo dos protestos é uma reação ao vandalismo predatório que os políticos e empresários praticam diariamente sobre os cofres públicos. O chavão “violência gera violência” não deixa de ser verdadeiro por ser uma frase desgastada, mas seu uso frequente no discurso parece não ter eco nas ações cotidianas das autoridades.
Métodos pacíficos de protesto não podem ser ensinados na escola, ou podem? Na escola sem partido, isso seria uma doutrinação? Sem nenhuma educação sobre protestos pacíficos, negociação diplomática de conflitos, o que me deixa espantada é que esses incidentes de violência não sejam mais numerosos e não tenham tantos participantes como os protestos contra o aumento da passagem dos ônibus há dois anos.
Cidadãos brasileiros, que veem os cortes do orçamento afetarem apenas os mais pobres e o Presidente Michel Temer perdoar as dívidas bilionárias de Bancos, naturalmente estão com muita raiva. Quem não está com raiva ou está mal informado e alienado, ou não tem princípios, ou é monge budista.
A integridade física do povo brasileiro é desrespeitada todos os dias quando é levado como gado para seus trabalhos em um transporte coletivo indigno de um ser humano. As pessoas da classe média ficam chocadas quando se queimam os ônibus, mas não entendem como é ficar por horas esperando, pagar para ser espremido ou simplesmente ter que parar de estudar porque a empresa resolveu interromper a circulação no horário noturno.
Claro que as consequências serão sofridas pelo próprio povo e ele sabe disso, mas em algum momento o sentimento de vingança contra todas as mazelas das quais são vítimas eclode e fica irrefreável. Nem o medo de bombas de efeito moral é capaz de estancar a revolta de pessoas que já não têm mais nada a perder.
Veja se algum político ou empresário algum dia se preocupou com a integridade física do povo. Agora os jornalistas estão com pena dos funcionários públicos e políticos ilhados em Brasília? O que os jornalistas esperavam? Que os brasileiros aceitassem ser feitos de palhaços a vida toda? O povo não aguenta mais.
Se é muito difícil para uma pessoa que tem fortes princípios pacifistas se controlar nesta situação; outra que não os têm nem tenta. Quem incutirá princípios pacifistas no povo? O Bolsonaro? Que diz que a população tem que se armar? Imaginem essas pessoas revoltadas em Brasília (com razão) e armadas como quer o mito? O único mito que se enquadra no perfil desse político é o do Caos, que se instalaria no Brasil se um povo com tanta raiva e sem formação para negociar diplomaticamente conflitos, começasse a se armar. Os primeiros a serem mortos, provavelmente, seriam os políticos bandidos e o mito se enquadra nesse perfil também, como ele mesmo confessou, recentemente.
Por isso, um dia, os políticos vão se arrepender amargamente de não terem cumprido suas promessas de campanha de investir em Educação de qualidade.
DANIEL AVELAR
DE SÃO PAULO
27/04/2017 07h00
Israel não conseguirá manter o sistema ideológico que o sustenta para sempre. Quem faz o prognóstico é o historiador israelense Ilan Pappé.
“Estamos em uma encruzilhada: as pessoas em Israel sabem do que o país fez no passado e faz no presente, mas a maioria ainda aceita isso e parece não se importar”, afirma o historiador, para quem pressões externas e “novas gerações” provocarão mudanças em Israel.
Pappé, 62, é um dos principais nomes dos chamados “novos historiadores israelenses”, grupo que analisa criticamente os eventos que levaram à fundação do Estado de Israel, em 1948, a partir do estudo de arquivos militares mantidos em sigilo até a década de 1980.
Ele escreveu o livro “A Limpeza Étnica na Palestina”, no qual argumenta que houve um processo planejado de expulsão e massacre de milhares de palestinos que viviam no território que viria a ser o Estado de Israel.
Sua hipótese contradiz a narrativa tradicional sobre o tema, segundo a qual os palestinos fugiram da região devido à guerra iniciada pelos países árabes contra Israel.
O historiador sofreu pressões e ameaças desde que publicou a obra, em 2006, e por isso hoje vive exilado no Reino Unido, onde é professor na Universidade de Exeter. Pappé, que está no Brasil para uma série de palestras de lançamento da edição brasileira da obra (ed. Sundermann), conversou com a Folha.
Leia, abaixo, trechos da entrevista.
*
Folha – Em seu livro, você defende a tese de que Israel foi fundado com base na limpeza étnica dos palestinos que viviam ali. Como seus compatriotas reagiram a essa ideia?
Ilan Pappé – No início, tentaram ignorar o livro e eu fui muito criticado, o que causou muitos problemas para mim. Aparentemente, para a academia israelense, falar que nosso país cometeu crimes contra a humanidade é cruzar uma linha vermelha.
A verdade é que as pessoas olham para os mesmos fatos com lentes diferentes. Se você vê o que aconteceu na Palestina em 1948 de uma perspectiva humanista, só se pode chegar a uma conclusão: as forças sionistas expulsaram milhares de pessoas e demoliram centenas de vilas palestinas, o que configura limpeza étnica.
Os israelenses não são os únicos a colonizar uma terra estrangeira, várias nações europeias fizeram isso no passado. Mas os israelenses são os únicos a negar o que fizeram.
Você acredita que a sociedade israelense mudou a percepção que tem sobre si mesma nos últimos anos?
Atualmente, há mais conhecimento do que nas últimas décadas sobre os acontecimentos de 1948. A grande maioria dos israelenses sabe que milhares de palestinos foram expulsos de suas casas e que 500 vilas foram apagadas do mapa. Estamos em uma encruzilhada: as pessoas em Israel sabem do que o país fez no passado e faz no presente, mas muitos ainda aceitam isso e parecem não se importar.
Eu acredito que uma resposta global dura e mudanças de percepção na comunidade judaica ao redor do mundo são fundamentais para que Israel deixe de cometer atrocidades.
Falo com muitos israelenses jovens e vejo uma atitude diferente, mais crítica do que as gerações anteriores. Por isso, sou otimista. Penso que Israel não conseguirá manter o sistema ideológico que o sustenta para sempre.
Donald Trump já indicou possíveis mudanças na política dos EUA para Israel, como transferir a embaixada para Jerusalém. O que seu governo pode representar?
Honestamente, creio que a política dos EUA para Israel não é apenas baseada na personalidade de um presidente. Todos pensavam que Barack Obama era pró-Palestina, mas na prática ele não mudou em nada as diretrizes da política americana. Há outros fatores em jogo, como o lobby pró-Israel e o as pressões do complexo militar-industrial, que ainda vê Israel como um ativo.
Por outro lado, a sociedade civil e a comunidade judaica nos EUA nunca foram tão críticas a Israel quanto hoje. Penso que muitas coisas vão mudar nos EUA, e Trump não é a causa dessas mudanças. Talvez seja um sintoma.
2017 marca o 50º aniversário da Guerra dos Seis Dias. Qual a relação desse evento com o processo que você chama de limpeza étnica?
Há uma continuidade histórica. Os judeus foram para a Palestina porque precisavam fugir do genocídio na Europa, mas implementaram um projeto colonial. Para o sionismo, que considero ser o último movimento colonial, é preciso ter o máximo da Palestina com o mínimo de palestinos possível, caso contrário o projeto não consegue se concretizar.
Em 1948, expulsaram a maioria dos palestinos para, ironicamente, criar uma democracia judaica em parte do território. Em 1967, resolveram ocupar o resto da Palestina, incorporando muitos dos palestinos que haviam sido expulsos em 1948. Isso criou um problema demográfico.
Para resolver esse problema, não houve expulsões sistemáticas, mas se fez algo tão ruim quanto a limpeza étnica. Israel implementou uma ocupação militar sem conceder cidadania, negando aos palestinos o direito de decidir sobre o próprio futuro.
Isso criou o que eu chamo de “megaprisões palestinas”, com graus diferentes de liberdade. Em algumas partes da Cisjordânia se é mais livre, como se fosse uma “prisão aberta”, mas Gaza, por exemplo, é tão fechada que nem se entra mais lá, só se bombardeia.
Quando, e por que, você passou a se opor ao sionismo?
Foi um processo longo, com várias etapas. Eu queria virar um historiador e percebia que as evidências que via não batiam com a narrativa sobre Israel que era apresentada para mim.
Na universidade, eu tive um orientador árabe e, quando estudei em Oxford, pude conversar com palestinos de igual para igual. Penso que o divisor de águas nesta travessia foi a invasão israelense ao Líbano em 1982. Pela TV, eu podia ver o que meu país estava fazendo e não tinha como justificar todas aquelas atrocidades.
Eu não tenho problemas com a ideia de um Estado judeu, mas isso se torna moralmente inaceitável quando depende da expulsão e opressão sistemática dos palestinos. Tenho lutado contra isso minha vida inteira.
Penso que existe uma alternativa para essa situação. Judeus e palestinos podem viver juntos em um Estado democrático, não precisam viver em um sistema de apartheid.
Por que você apoia o BDS (campanha de boicote, desinvestimento e sanções contra Israel)?
Eu acreditava que a diplomacia e o processo de paz poderiam resolver o problema, mas passaram-se anos e a ocupação continuou. Também comecei a perceber que o problema não era a política do governo, mas a ideologia do Estado.
Por isso, passei a apoiar o BDS. Como israelense, aceitar isso era difícil para mim no começo, era o mesmo que dizer “por favor, me boicote”. Os israelenses contrários à campanha a acusam de ser antissemita ou, no caso do boicote às universidades israelenses, dizem que é um ataque à liberdade de expressão. Repetem que a solução é dialogar.
Mas a verdade é que as tentativas de diálogo anteriores fracassaram e o BDS, de algum modo, nos obriga a conversar, ainda que não seja uma conversa agradável.
Acusar o BDS de ser antissemita não é um argumento bem pensado, embora possa convencer pessoas inteligentes. Não há qualquer paralelo entre uma forma de preconceito que está aí há milhares de anos e os pedidos para que um grupo —que diz agir em nome de todos os judeus– pare de cometer violações de direitos humanos.
Eu acredito que precisamos mudar todo o vocabulário que usamos para nos referir à questão Israel/Palestina. Em vez de falar em processo de paz, devemos começar a falar em descolonização.
Isso é um grande desafio pois sabemos como ocorreram descolonizações no passado, mas não fazemos ideia do que isso significa no século 21. Palestinos vivem situações muito diferentes em Gaza, na Cisjordânia e em Israel, e também é preciso pensar no retorno dos refugiados.
Para mim, é muito inspiradora a forma como o processo de descolonização se deu na África do Sul. Esse exemplo nos mostra exatamente o que buscamos: não queremos vingança, mas reparação.
*
RAIO-X
ILAN PAPPÉ
Nascimento
Haifa (Israel), 7 de novembro de 1954
Formação
Graduação em história na Universidade Hebraica de Jerusalém e pós-doutorado na Universidade de Oxford
Ocupação
Professor da Universidade de Exeter
Principais obras
“História da Palestina Moderna: Uma Terra, Dois Povos”, “Os Palestinos Esquecidos: A História dos Palestinos em Israel” e “A Limpeza Étnica da Palestina” (ed. Sundermann)
Leiam porque a Rede Globo, SBT e outras emissoras estão se esperneando tanto para derrubar a Dilma e porque os globais foram aos protestos
Por que a dívida da Globo não é manchete de jornal?
O que descobriríamos se os jornalistas brasileiros fossem atrás das denúncias de sonegação que envolvem grandes grupos de comunicação e que não viram notícia no país?
por Intervozes — publicado 31/07/2014 21h32, última modificação 02/08/2014 14h58
Por Bruno Marinoni*
“Siga o dinheiro”, aconselhava William Mark Felt, o “garganta profunda”, aos jovens jornalistas que, nos anos 70, revelaram todo um esquema de espionagem e corrupção no interior da Casa Branca. O que não descobriríamos então se os jornalistas da mídia brasileira investigassem, por exemplo, a denúncia de que a Globo deve mais de R$ 600 milhões aos cofres públicos porque sonegou o imposto decorrente da compra dos direitos de transmissão da Copa de 2002?
O caso, que já vinha sendo anunciado há algum tempo, ganhou novo capítulo no último dia 17 de julho, quando 29 páginas do processo na Receita Federal contra a Globo foram divulgados em um blog na internet. A emissora teria usado 10 empresas criadas em paraísos fiscais para esconder a fraude. Com o esquema, o sistema Globo teria incorrido em simulação e evasão fiscal. O imposto sobre importâncias enviadas para o exterior para aquisição de direitos de transmissão no caso da empresa beneficiária estar sediada em paraísos fiscais seria de 25%, se fosse pago.
E se os jornalistas da nossa mídia fossem, por outro exemplo, atrás do papel que a Igreja Universal, milionária e com isenção fiscal por se tratar de uma entidade religiosa, cumpre no financiamento da Record? Uma matéria intitulada “Macedo nega uso do dinheiro da igreja na compra de TV”, publicada na Folha de São Paulo, em setembro de 1998 (quando a emissora não era ainda uma competidora de peso), afirmou que investigações da Receita resultaram em uma multa de R$ 265 milhões ao grupo. A maior parte do pagamento, ou R$ 118 milhões, coube à Record; outros R$ 98 milhões, à própria Igreja Universal, e mais R$ 6 milhões, a Edir Macedo. Esses valores se refeririam a autuações e multas por sonegação fiscal e outras irregularidades.
Além disso, a imprensa já veiculou algumas vezes que a Igreja Universal compraria a faixa da madrugada da TV Record, que tem baixíssima audiência, por um preço muito acima do mercado. Todavia, até onde sabemos, nada foi feito para resolver essa questão.
Em 2010, foi a vez de Sílvio Santos, dono do SBT, se envolver em um escândalo de fraude fiscal, uma dívida de R$ 3,8 bilhões. O evento não se relacionava diretamente com os meios de comunicação, e sim com seu banco, o “Panamericano”. O dono da empresa, porém, empenhou todo o seu patrimônio, inclusive seus canais de TV, como garantia de que a dívida seria sanada.
Quando poucos grupos controlam os meios de comunicação, quando há concentração do poder midiático é fácil criar um bloqueio a informações desfavoráveis aos donos da mídia por meio de uma estratégia “positiva”: preenchendo-se a agenda de temas discutidos pela sociedade com uma série de assuntos que não atinjam os interesses daqueles que controlam os canais de comunicação.
Escândalos de corrupção e desvio de dinheiro público são sempre matérias na nossa imprensa, mas qual a seleção de casos que é feita? O que fica de fora? Quem fica de fora dessas páginas? Se há um grande número e diversidade de atores dirigindo os meios de comunicação, maior a possibilidade de nos relacionarmos com canais suficientemente independentes para nos fornecer informações de interesse público. Mas isso é algo em falta no Brasil.
* Bruno Marinoni é repórter do Observatório do Direito à Comunicação, doutor em Sociologia pela UFPE e integrante do Intervozes.
Filósofo e ex-ministro da Educação de Dilma critica falta de independência dos jornalistas e partidarização da imprensa no País
Fonte: Renato Janine Ribeiro: “No Brasil temos uma imprensa que efetivamente mente”
Os rastignacs¹ do século XXI
O Governo Federal gastou R$ 13,9 bilhões com publicidade nas emissoras de televisão nos últimos 12 anos. Só a Rede Globo recebeu R$ 6 bilhões. No governo de Fernando Henrique Cardoso, a Globo recebia 49% do total destinado a publicidade, mas atualmente recebe apenas 36%: R$ 452 milhões no último ano. Isso tudo só na televisão, sem contar os sites, as afiliadas, jornais e revistas impressas e virtuais.
Outras empresas também recebem, mas muito menos: a Veja, por exemplo, recebeu R$ 700 milhões.
Aí então né, vem uns “diogos mainardis da vida” dizer que não dependem de dinheiro público, atacando os outros de “mamar nas tetas do governo” (chavão vulgar e agressivo no estilo provinciano que eles estão tão acostumados a usar).
Esses diogos, pois há vários, têm o cinismo de dizer que são contra a intervenção do Governo na economia, a favor do livre mercado, do Estado mínimo, mas aceitam trabalhar num jornal que engorda sua receita com dinheiro público, que deveria ser usado em hospitais, escolas, segurança.
Agora entendo o porquê de vocês bajularem FHC: ele pagava muito mais (proporcionalmente falando) do que o atual governo para completar a receita da emissora onde os mainardis, rastignacs do século XXI, trabalham.
Quando o Sr. Diogo Mainardi ofendeu os nordestinos, chamando-os de bovinos, ignorantes, atrasados e que o voto deles era comprado com dinheiro público, o chamado voto de cabresto, eu tentei justificá-lo dizendo que ele havia se expressado mal num rompante momentâneo de ódio contra o resultado das urnas: a Dilma havia ganhado. Justifiquei sua atitude imaginando que talvez ele quisesse se referir apenas aos políticos nordestinos que abusavam assim do povo mais humilde.
Na verdade, esse Nordeste, que Diogo não visita há muito tempo porque teve de fugir da justiça brasileira para a Itália, mudou. Muitas empresas se mudaram para lá; a indústria automobilística, por exemplo. Muitas Universidades Federais foram construídas (no Brasil todo 18), vinícolas, resorts etc. O Programa Bolsa Família tirou milhões de crianças das ruas e levou-as às escolas, porque essa é a condição para recebê-lo. Então o cabresto está sendo retirado aos poucos conforme o nível socio-econômico aumenta. Muitas dessas crianças aprenderão a ler e um dia encontrarão na internet referências a nordestinos para algum trabalho escolar e encontrarão seu discurso raivoso e terão certeza de uma coisa: o partido que Diogo Mainardi apoiar não será o nosso, não nos representa.
Esses diogos, assim como Eugène de Rastignac, nunca pertencerão à nata europeia, nunca; serão sempre, para alguns europeus sofisticados e elitistas, um cidadão de segunda classe, um bronco, um imigrante, um refugiado, um provinciano. Assim, eu recomendo que ele aprenda a falar direito com as pessoas, com bons modos e bom humor. Recomendo que ele faça as pazes com os brasileiros!
Agora tenho a convicção de que precisamos tirar o cabresto da imprensa nacional.
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1- Eugène de Rastignac é um personagem do livro O pai Goriot do escritor francês Honoré de Balzac. Rastignac, em seu sentido comum, significa também arrivista, ambicioso que quer subir na vida a qualquer preço e pertencer a elite, que inveja. O personagem, vindo do interior, chega a Paris do século XIX disposto a vencer. Para isso segue os conselhos de Vautrin, um criminoso perigoso, que conhece na pensão onde moram. Este o aconselha a se aliar a mulheres nobres ricas a fim de obter favores de seus maridos e trama um plano para Rastignac se casar com uma rica herdeira, assassinando o irmão dela.
Com esse documentário, chega-se a conclusão de que paz e capitalismo neoliberal são incompatíveis. O capitalismo precisa da guerra, o que é trágico.
Numa longa conversa, Chomsky analisa as principais tendências do cenário internacional, critica a escalada militarista do seu país e afirma que as alterações climáticas são o pior problema que a humanidade já enfrentou. Por Agustín Fernández Gabard e Raúl Zibechi
9 de Fevereiro, 2016 – 15:08h
“Os Estados Unidos foram sempre uma sociedade colonizadora. Ainda antes de se constituir como Estado estava a eliminar a população indígena, o que significou a destruição de muitas nações originais”, sintetiza o linguista e ativista norte-americano Noam Chomsky quando se lhe pede que descreva a situação política mundial. Crítico acérrimo da política externa do seu país, argumenta que desde 1898 se virou para o cenário internacional com o controle de Cuba, “que converteu essencialmente em colônia”, para depois invadir as Filipinas, “assassinando milhares de pessoas”.
Continua a alinhavar uma espécie de contra-história do império: “Depois roubou o Hawai à sua população original, 50 anos antes de incorporá-la como mais um estado”. Imediatamente depois da segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos converteram-se em potência internacional, “com um poder sem precedente na história, um incomparável sistema de segurança, controlava o hemisfério ocidental e os dois oceanos, e naturalmente traçou planos para tentar organizar o mundo de acordo com os seus desejos”.
Concorda que o poder da superpotência diminuiu em relação ao que tinha em 1950, o pico do seu poder, quando acumulava 50 por cento do produto interno bruto mundial, que agora caiu para 25 por cento. Ainda assim, parece-lhe necessário recordar que os Estados Unidos continuam a ser “o país mais rico e poderoso do mundo, e a nível militar é incomparável”.
Um sistema de partido único
Há algum tempo Chomsky comparou as votações no seu país com a escolha de uma marca de pasta de dentes num supermercado. “O nosso é um país de um só partido político, o partido da empresa e dos negócios, com duas facções, democratas e republicanos”, proclama. Mas acha que já não é possível continuar a falar de duas velhas comunidades políticas, já que as suas tradições sofreram uma mutação completa durante o período neoliberal.
“São os republicanos modernos que se fazem chamar democratas, enquanto a antiga organização republicana ficou fora do espectro, porque ambas as partes se deslocaram para a direita durante o período neoliberal, tal como aconteceu na Europa”. O resultado é que os novos democratas de Hillary Clinton adotaram o programa dos velhos republicanos, enquanto estes foram completamente tomados pelos neoconservadores. “Se você vir os espetáculos televisivos onde dizem debater, só gritam uns com os outros e as poucas políticas que apresentam são aterradoras”.
Os Estados Unidos continuam a ser “o país mais rico e poderoso do mundo, e militarmente é incomparável”
Por exemplo, ele aponta que todos os candidatos republicanos negam o aquecimento global ou são céticos, que apesar de não o negarem dizem que os governos não devem fazer algo sobre isso. “No entanto, o aquecimento global é o pior problema que a espécie humana jamais enfrentou, e nos dirigimos para um desastre completo”. Na opinião dele, as alterações climáticas têm efeitos só comparáveis com a guerra nuclear. Pior ainda, “os republicanos querem aumentar o uso de combustíveis fósseis. Não estamos perante um problema de centenas de anos, mas de uma ou duas gerações”.
A negação da realidade, que caracteriza os neoconservadores, corresponde a uma lógica semelhante à que impulsiona a construção de um muro na fronteira com o México. “Essas pessoas que tentamos afastar são as que fogem da destruição causada pelas políticas norte-americanas”.
“Em Boston, onde vivo, há um par de dias o governo de Obama deportou um guatemalteco que viveu aqui durante 25 anos; tinha uma família, uma empresa, era parte da comunidade. Tinha escapado da Guatemala destruída durante a administração Reagan. Em resposta, a ideia é construir um muro para proteger-nos. Na Europa é o mesmo. Quando vemos milhões de pessoas fugindo da Líbia e da Síria para a Europa, temos que nos interrogar sobre o que aconteceu nos últimos 300 anos para chegarmos a isto”.
Invasões e alterações climáticas retroalimentam-se
Há apenas 15 anos não existia o tipo de conflito que observamos hoje no Médio Oriente. “É consequência da invasão norte-americana do Iraque, que é o pior crime do século. A invasão britânico-norte-americana teve consequências horríveis, destruíram o Iraque, que agora é classificado como o país mais infeliz do mundo, porque a invasão tirou a vida a centenas de milhares de pessoas e criou milhões de refugiados, que não foram acolhidos pelos Estados Unidos e tiveram que ser recebidos pelos países vizinhos pobres, os quais foram encarregados de recolher as ruínas do que nós destruímos. E o pior de tudo é que instigaram um conflito entre sunitas e xiítas que não existia antes”.
As palavras de Chomsky recordam a destruição da Iugoslávia durante a década de 1990, instigada pelo Ocidente. Destaca que, tal como Sarajevo, Bagdá era uma cidade integrada, onde os diversos grupos culturais compartilhavam os mesmos bairros, se casavam com membros de diferentes grupos étnicos e religiões. “A invasão e as atrocidades que se seguiram instigaram a criação de uma monstruosidade chamada Estado Islâmico, que nasce com financiamento saudita, um dos nossos principais aliados no mundo”.
Um dos maiores crimes foi, em sua opinião, a destruição de grande parte do sistema agrícola sírio, que assegurava a alimentação, o que levou milhares de pessoas para as cidades, “criando tensões e conflitos que explodem mal começa a repressão”.
Uma das suas hipóteses mais interessantes consiste em cruzar os efeitos das intervenções armadas do Pentágono com as consequências do aquecimento global.
Na guerra no Darfur (Sudão), por exemplo, os interesses das potências convergem com a desertificação que expulsa populações inteiras das zonas agrícolas, o que agrava os conflitos. “Estas situações desembocam em crises horríveis, como acontece na Síria, onde se registra a maior seca da sua história que destruiu grande parte do sistema agrícola, gerando deslocamentos, exacerbando tensões e conflitos”, reflete.
Ainda não temos pensado profundamente, destaca, sobre o que implica esta negação do aquecimento global e os planos a longo prazo que os republicanos pretendem acelerar: “Se o nível do mar continua a subir e sobe mais rapidamente, vai engolir países como o Bangladesh, afetando centenas de milhões de pessoas. Os glaciares do Himalaia estão derretendo rapidamente, pondo em risco o abastecimento de água ao sul da Ásia. Que vai acontecer a essas milhões de pessoas? As consequências iminentes são horrendas, este é o momento mais importante na história da humanidade”.
Chomsky acredita que estamos perante uma curva da história em que os seres humanos têm que decidir se querem viver ou morrer: “Digo-o literalmente. Não vamos morrer todos, mas se destruiriam as possibilidades de vida digna, e temos uma organização chamada Partido Republicano que quer acelerar o aquecimento global. Não exagero – remata– é exatamente o que querem fazer”.
A seguir, cita o Boletim de Cientistas Atômicos e o seu Relógio do Apocalipse, para recordar que os especialistas sustentam que na Conferência de Paris sobre o aquecimento global era impossível conseguir um tratado vinculante, apenas acordos voluntários. “Por quê? Porque os republicanos não o aceitariam. Bloquearam a possibilidade de um tratado vinculante que poderia ter feito algo para impedir essa tragédia em massa e iminente, uma tragédia como nunca existiu na história da humanidade. É disso que estamos a falar, não são coisas de importância menor”.
Guerra nuclear, possibilidade certa
Chomsky não é das pessoas que se deixam impressionar por modas acadêmicas ou intelectuais; o seu raciocínio radical e sereno procura evitar furores e, talvez por isso, mostra-se avesso a aceitar a anunciada decadência do império. “Tem 800 bases em todo o mundo e investe no seu exército tanto como todo o resto do mundo. Ninguém tem algo assim, com soldados combatendo em todas as partes do mundo. A China tem uma política principalmente defensiva, não possui um grande programa nuclear, ainda que possa crescer”.
O caso de Rússia é diferente. É a principal pedra no sapato da dominação do Pentágono, “porque tem um sistema militar enorme”. O problema é que tanto a Rússia como os Estados Unidos estão a ampliar os seus sistemas militares, “ambos estão a atuar como se a guerra fosse possível, o que é uma loucura coletiva”. Pensa que a guerra nuclear é irracional e que só poderia acontecer em caso de acidente ou erro humano. No entanto, coincide com William Perry, ex-secretário da Defesa, que disse recentemente que a ameaça de uma guerra nuclear é hoje maior do que era durante a Guerra Fria. Chomsky considera que o risco se concentra na proliferação de incidentes que envolvem forças armadas de potências nucleares.
“A guerra esteve muito próxima inúmeras vezes”, admite. Um dos seus exemplos favoritos é o que aconteceu durante o governo de Ronald Reagan, quando o Pentágono decidiu por à prova a defesa russa mediante a simulação de ataques contra a União Soviética.
“Resultou que os russos levaram isso muito a sério. Em 1983, depois de os soviéticos automatizarem, os seus sistemas de defesa detectaram um ataque de míssil norte-americano. Nestes casos o protocolo é ir diretamente ao alto comando e lançar um contra-ataque. Havia uma pessoa que tinha que transmitir essa informação, Stanislav Petrov, mas decidiu que era um falso alarme. Graças a isso, estamos aqui falando”.
Aponta que os sistemas de defesa dos Estados Unidos têm erros sérios e há umas semanas foi divulgado um caso de 1979, quando se detectou um ataque em massa com mísseis a partir da Rússia. Quando o conselheiro de Segurança Nacional, Zbigniew Brzezinski, estava levantando o telefone para chamar o presidente James Carter e lançar um ataque de represália, chegou a informação de que se tratava de um falso alarme. “Há dezenas de falsos alarmes em cada ano”, assegura.
Neste momento as provocações dos Estados Unidos são constantes. “A NATO está realizando manobras militares a 200 metros da fronteira russa com a Estônia. Nós não toleraríamos algo assim que acontecesse no México”.
O caso mais recente foi o abate de um caça russo que estava a bombardeando forças jihadistas na Síria em fins de novembro. “Há uma parte da Turquia rodeada por território sírio e o bombardeiro russo voou através dessa zona durante 17 segundos, e derrubaram-no. Uma grande provocação que felizmente não foi respondida pela força, mas levaram o seu mais avançado sistema antiaéreo para a região, o que lhes permite derrubar aviões da NATO”. Argumenta que fatos semelhantes estão acontecendo diariamente no mar da China.
A impressão que emerge dos seus gestos e reflexões é que se as potências que são agredidas pelos Estados Unidos atuassem com a mesma irresponsabilidade que Washington, o destino estaria traçado.
Entrevista com Noam Chomsky, por Agustín Fernández Gabard e Raúl Zibechi, publicada no jornal La Jornada em 7 de fevereiro de 2016. Tradução de Carlos Santos com alterações de Thaís de Godoy para o português do Brasil